Paul Éluard
Quero viver para sempre
nem que para isso tenha de morrer
Sim quero viver para sempre
mesmo na minha morte ser
porventura a palavra Fim
e arranjar a melhor maneira
de ser dita nesse som nasal e breve
numa arrastada eternidade
Quero atravessar por aí a fronteira
reanimar-me mal me digas alto
e aí porei o pé na prosódia mais curvada
subirei aos teus lábios sem medo do vazio
pois sei que daí serei lançada
num som convicto da minha vida
Sim saltarei de escuridão em escuridão
até abrir a minha claridade em todo o poema
em todo esse trajecto aéreo maravilhada
até cair na terra e sujar os pés deliciada
deixando entrar no rosto cheiros distantes
de olhos fechados (mesmo sem rosto
mesmo sem esses olhos comidos pelos bichos)
sentir o odor das flores mais belas
(mesmo a meio desse horror da decomposição)
sentir o odor do mar tão grande
sentir o odor das fragas tão sós
(e apetece cantar com estes cheiros tão anafóricos)
sei: inspirarei momentânea toda essa simplicidade
para durar como uma folha antiga perdida
gozando de ser coisa táctil
coisa audível sempre presente
na voz de quem me disser.
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